quarta-feira, 15 de abril de 2009

CRITICA DE ARIANO SUASSUNA SOBRE O FORRÓ ATUAL

A cultura do lixo

Não sei se o texto é realmente de Ariano Suassuna, mas vale a pena ler...

CRITICA DE ARIANO SUASSUNA SOBRE O FORRÓ ATUAL

'Tem rapariga aí? Se tem levante a mão!'.

A maioria, as moças, levantam amão.

Diante de uma platéia de milhares de pessoas, quase todas muito jovens,pelo menos um terço de adolescentes, o vocalista da banda que se diz deforró utiliza uma de suas palavras prediletas (dele só não, e todas bandasdo gênero).. As outras são 'gaia', 'cabaré', e bebida em geral, com ênfasena cachaça. Esta cena aconteceu no ano passado, numa das cidades dedestaque do agreste (mas se repete em qualquer uma onde estas bandas seapresentam). Nos anos 70, e provavelmente ainda nos anos 80, o vocalistateria dificuldades em deixar a cidade.


O secretário de cultura Ariano Suassuna foi bastante criticado, numaaula-espetáculo, no ano passado, por ter malhado uma música da BandaCalipso, que ele achava (deve continuar achando, claro) de mau gosto. Vaidaí que mostraram a ele algumas letras das bandas de 'forró', e Arianoexclamou: 'Eita que é pior do que eu pensava'. Do que ele, e muito maisgente jamais imaginou.


Pra uma matéria que escrevi no São João passado baixei algumas músicas bemrepresentativas destas bandas. Não vou nem citar letras, porque este jornalé visto por leitores virtuais de família. Mas me arrisco a dizer algunstítulos, vamos lá: Calcinha no chão (Caviar com Rapadura), Zé Priquito(Duquinha), Fiel à putaria (Felipão Forró Moral), Chefe do puteiro (Aviõesdo forró), Mulher roleira (Saia Rodada), Mulher roleira a resposta (ForróReal), Chico Rola (Bonde do Forró), Banho de língua(Solteirões do Forró), Vou dá-lhe de cano de ferro (Forró Chacal), Dinheirona mão, calcinha no chão (Saia Rodada), Sou viciado em putaria (Ferro naBoneca), Abre as pernas e dê uma sentadinha (Gaviões do forró), Tapa nacara, puxão no cabelo (Swing do forró). Esta é uma pequeníssimalista do repertório das bandas.


Porém o culpado desta 'desculhambação' não é culpa exatamente das bandas,ou dos empresários que as financiam, já que na grande parte delas,cantores, músicos e bailarinos são meros empregados do cara que investe nogrupo. O buraco é mais embaixo. E aí faço um paralelo com o turbo folk, umsubgênero musical que surgiu na antiga Iugoslávia, quando o país estavaesfacelando-se. Dilacerado por guerras étnicas, em pleno governo dotresloucado Slobodan Milosevic surgiu o turbo folk, mistura de pop, commúsica regional sérvia e oriental. As estrelas da turbo folk vestiam-secomo se vestem as vocalistas das bandas de 'forró', parafraseando LuizGonzaga, as blusas terminavam muito cedo, as saias e shortes começavammuito tarde.

Numa entrevista ao jornal inglês The Guardian, o diretor doCentro de Estudos alternativos de Belgrado. Milan Nikolic, afirmou, em2003, que o regime Milosevic incentivou uma música que destruiu o bom-gostoe relevou o primitivismo estético. Pior, o glamour, a facilidade estética,pegou em cheio uma juventude que perdeu a crença nos políticos, nos valoresmorais de uma sociedade dominada pela máfia, que, por sua vez, dominava ogoverno.


Aqui o que se autodenomina 'forró estilizado' continua de vento em popa.Tomou o lugar do forró autêntico nos principais arraiais juninos doNordeste. Sem falso moralismo, nem elitismo, um fenômeno lamentável, emerecedor de maior atenção. Quando um vocalista de uma banda de músicapopular, em plena praça pública, de uma grande cidade, com presença deautoridades competentes (e suas respectivas patroas) pergunta se tem'rapariga na platéia', alguma coisa está fora de ordem. Quando canta umacanção (canção?!!!) que tem como tema uma transa de uma moça com doisrapazes (ao mesmo tempo), e o refrão é 'É vou dá-lhe de cano de ferro/etoma cano de ferro!', alguma coisa está muito doente. Sem esquecer que umajuventude cuja cabeça é feita por tal tipo de música é a que vai tomar asrédeas do poder daqui a alguns poucos anos.

Ariano Suassuna

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